Brasao TCE TRIBUNAL DE CONTAS DO ESTADO DO TOCANTINS
GABINETE DA 2ª RELATORIA

   

12. VOTO Nº 104/2022-RELT2

12.1. DA ADMISSIBILIDADE E DO PROCESSAMENTO

12.1.1. Para regular conhecimento e processamento dos recursos no âmbito deste Sodalício, é necessário a apreciação dos pressupostos de admissibilidade, dentre reles o cabimento da espécie recursal, a legitimidade, o interesse do recorrente e a tempestividade do recurso.

12.1.2. In casu, infere-se que a modalidade se mostra adequada, pois o Acórdão recorrido é decorrente de matéria apreciada por Câmara Julgadora, sendo cabível, portanto, Recurso Ordinário, em conformidade com o art. 46 da Lei nº 1.284/2001. Ademais, a peça recursal preenche os requisitos de tempestividade e legitimidade, motivo pelo qual conheço do Recurso em apreciação.

12.2. DO MÉRITO

12.2.1. Inicialmente, importa frisar que o responsável recebeu o julgamento pela irregularidade de suas contas da Tomada de Contas Especial, conforme trecho do Acórdão nº 579/2021- 2ª CÂMARA, já exposto no Relatório.

12.2.2. Pois bem, conforme supramencionado, as sanções aplicadas na decisão fustigada foram:

12.2.2.1. Imputação de débito, em solidariedade, para os recorrentes no valor de R$ 46.922,00, em razão da Aquisição de combustível sem a devida prestação de contas, sendo que as requisições apresentadas não contêm os dados dos veículos abastecidos, assim como, não existe nenhum cadastro dos veículos dos parlamentares e demais controles que comprovem as finalidades dos gastos;

12.2.2.2. Aplicação de multa de 1% (um por cento) do valor atualizado do dano causado ao erário, com fundamento no art. 38 da LOTCE/TO c/c art. 158 do RITCE/TO, tendo em vista a gravidade da infração causadora de dano ao erário.

12.2.2.3. Aplicação de multa individual no valor de R$ 1.400,00, com fundamento no art. 39, incisos II e III, da LOTCE/TO c/c os art. 159, II e III, do RITCE/TO, por conta dos seguintes apontamentos:

12.2.3.1. No processo nº 1002/2017, foi realizada contratação direta de serviços técnicos e de planejamento do Poder Legislativo no montante de R$ 3.500,00, não foi realizada pesquisa de mercado/cotação prévia para demonstrar que o preço contratado estava de acordo com o praticado no mercado, em descumprimento ao art. 15, inc. III e V da Lei nº 8.666/93. Item 2.1 do Relatório de Auditoria;

12.2.3.2. Ocorrência de licitação direcionada, com infração à norma inscrita no Artigos 14 e 38, caput, da Lei nº 8.666/93. Item 2.4 do Relatório de Auditoria.

12.2.3. Os recorrentes trazem argumentos de contestação das referidas sanções sem acostar novos documentos que podem ser sintetizados nos excertos abaixo delineados:

Diferente do indicado no Relatório de Auditoria, todo o combustível pago com recurso foi consumido visando as atividades da Câmara Municipal de Formoso do Araguaia.
(...)
A Frota da câmara era pequena, e necessitava se de abastecer veículos dos próprios vereadores para fazer a fiscalização do poder executivo municipal, viagens a Palmas e a Brasília, para desenvolverem suas atividades legislativas.
Desta Feita, Excelência, não há diferença entre a aquisição e o consumo, todo o combustível adquirido foi utilizado na câmara municipal, não havendo que se falar em ressarcimento.
(...)
Diversos são os departamentos internos dos órgãos e entidades públicos responsáveis pelo processamento regular da despesa, não dependendo unicamente da vontade pessoal do gestor a determinação de pagamento das contas ou faturas.
(..)
Imputar responsabilidade direta ao gestor, sem a devida apuração, viola o princípio do devido processo legal.
(...)
 No caso em análise, conforme demonstrado anteriormente, ainda que não haja o controle efetivo do gasto de combustível por veículo/maquina, tal irregularidade não condiz a imputação de débito do valor gasto com combustíveis e lubrificantes, trazendo uma sobrecarga injusta ao “responsáveis”. Tem-se, portanto, que a pena indicada no Relatório de Auditoria foge ao Princípio da Razoabilidade.

12.2.4. Passemos a analisar ponto a ponto tais argumentos.

12.2.5. A Administração Pública tem como princípio basilar a publicidade e a motivação dos atos. As alegações de que a frota da Câmara e que o combustível foi utilizado em viagens a serviço desprovidas de qualquer prova documental ou qualquer instrumento de controle verificável são patentemente descabidas.

12.2.6. Os gestores públicos precisam implementar controle da frota quanto à quilometragem/ horas, combustível, peças e serviços, de forma individual por veículo, bem como adotar termo de responsabilidade. Nenhum destes elementos foram acostados neste Recurso Ordinário. A necessidade de tais requisitos tem como base, inclusive, posição já consolidada no Acórdão 491/2011-TCE/TO, que tratou sobre diretrizes básicas no controle dos gastos em combustível.

12.2.7. Desta forma, não merecem prosperar as alegações trazidas que buscam justificar despesas de combustíveis sem a devida juntada de documentos comprobatórios. Outro viés de argumentação está relacionado com a responsabilização dos gestores e a razoabilidade da aplicação das sanções.

12.2.8. Em suma, os recorrentes apontam que não poderiam ter o débito imputado já que o combustível foi efetivamente utilizado para fins do interesse público. Primeiramente, não há nos autos qualquer prova de que os valores imputados foram gastos na consecução de atividades ligadas ao órgão. Não se poderia, por exemplo, alegar-se erro jurídico-administrativo, ou seja, que os gestores não sabiam que a forma de processamento da despesa realizada era ilegal, configurando-se erro irresistível, ou seja, que pode elidir a culpabilidade do agente.

12.2.9. Não caberia ao Tribunal, como órgão sancionador, constituir prova de que os gestores efetivamente conheciam, ou não, a ilegalidade. Como aponta Fábio Medina Osório:

 
A acusação deve comprovar que o agente poderia, com um mínimo de diligência, conhecer a figura típica, além de comprovar os fatos. Eis o ônus probatório do acusador. Não necessita provar que o agente efetivamente conhecia a ilegalidade de sua conduta. Basta o potencial conhecimento. Aqui, os princípios da razoabilidade e moralidade administrativas funcionarão com especial intensidade. A conduta do agente, seus sinais, seu proceder revelam, de regra, suas intenções. Além disso, seu cargo, sua condição fática, cultural, econômica, sua posição social, seu assessoramento, são fatores que contribuem para a análise do elemento subjetivo de sua conduta.
Já a defesa deve provar que, apesar de todas as diligências possíveis, o agente não logrou o conhecimento dos elementos da figura típica ou não conseguiu orientar adequadamente sua vontade. O erro deve ser provado pela defesa, não pela acusação. Pouco importa que se trate de erro de tipo ou de proibição. De qualquer modo, o erro invencível exclui a responsabilidade subjetiva e é tratado como causa excludente da imputação ou da responsabilidade.[1] (grifos nossos)

12.2.10. Sendo assim, trata-se de culpabilidade evidente que não foi elidida nem nos autos da Tomada de Contas, nem nesta oportunidade. Em relação à imputação do valor do débito, por sua própria natureza, não se pode definir o quanto do valor poder-se-ia atribuir aos responsáveis para fins de atendimento à proporcionalidade e razoabilidade. Uma vez verificado o débito, ele deve ser imputado integralmente. Esse é, por exemplo, o entendimento do TCU no seguinte caso:

TOMADA DE CONTAS ESPECIAL. RECURSOS REPASSADOS PELO FNDE À PREFEITURA MUNICIPAL DE CONCEIÇÃO/PB, NO EXERCÍCIO DE 2008. PROGRAMA BRASIL ALFABETIZADO. AÇÕES DE FORMAÇÃO DE ALFABETIZADORES. NÃO APRESENTAÇÃO DE DOCUMENTOS CAPAZES DECOMPROVAR A REALIZAÇÃO DOS SERVIÇOS. IMPUGNAÇÃO DAS DESPESAS. RESPONSABILIDADE SOLIDÁRIA DO EX-PREFEITO E DO INSTITUTO LUDUS. CITAÇÃO. REVELIA DA ENTIDADE. REJEIÇÃO DAS ALEGAÇÕES DE DEFESA DO EX-PREFEITO. CONTAS IRREGULARES. DÉBITO SOLIDÁRIO. MULTAS. RECURSOS DE RECONSIDERAÇÃO. CONHECIMENTO. NÃO PROVIMENTO DO RECURSO INTERPOSTO PELO GESTOR MUNICIPAL. PROVIMENTO DO RECURSO INTERPOSTO PELO CONTRATADO. CIÊNCIA.
(...)
12. A mera alegação de que os recursos teriam sido regularmente aplicados, desprovida de documentos capazes de sustentá-la, não pode ser acolhida. Cabe ao gestor prestar contas da integralidade das verbas federais recebidas, cabendo-lhe o ônus da prova quanto à boa e regular aplicação desses recursos, nos termos do art. 70, parágrafo único, da Constituição Federal[2]. (Grifo nosso).

12.2.11. Somente em relação à multa vinculada ao débito é que se pode avaliar a aplicação dos princípios apontados. No caso, foi arbitrado somente 1% do valor do débito. Ou seja, entendo que os princípios balizadores foram contemplados. Já em relação à multa por apontamentos de falha nas contratações (R$ 700,00 para cada irregularidade por gestor) encontra-se parametrizada com sanções similares ao que este Sodalício vem aplicando para casos semelhantes. Por exemplo, vide o Acórdão 653/2021 – PRIMEIRA CÂMARA, que aplicou R$ 1.500,00 neste mesmo apontamento para fins de multa.

12.2.12. Deve-se ressaltar que os recorrentes não apresentaram, nas razões do Recurso, contradita às ilegalidades encontradas nas contratações (que constam no item 9.5 do Acórdão). Assim, ante a não devolução da matéria para nossa apreciação no âmbito recursal, ocorreu o trânsito em julgado administrativo do mesmo, por inequívoca preclusão temporal e consumativa.

12.2.13. Diante disso, coaduno com as jurisprudências supracitadas, acompanho o entendimento do Ministério Público de Contas para conhecer do presente Recurso, e no mérito, negar-lhe provimento, mantendo inalterado os termos do Acórdão nº 579/2021-SEGUNDA CÂMARA.

13. DECISÃO

 13.1. Ante o exposto, considerando as fundamentações supra, VOTO no sentido de que este Sodalício acate as seguintes providências, adotando a Decisão, sob forma de Acórdão, o qual submeto ao Pleno:

13.2. Conhecer do Recurso Ordinário interposto, para, no mérito, negar-lhe provimento, mantendo inalterados os termos do Acórdão nº 579/2021-SEGUNDA CÂMARA, nos termos do art. 85, inciso III, alínea b, da Lei nº 1.284/2001.

13.3. Determinar a publicação desta Decisão no Boletim Oficial do Tribunal de Contas do Estado do Tocantins, nos termos do art. 27, caput, da Lei nº 1.284/2001 e art. 321, §³º, do Regimento Interno, para que surta seus efeitos legais, inclusive para eventual interposição de recurso.

13.4. Determinar a cientificação dos recorrentes, conforme ações de mister desta Corte de Contas acerca do Relatório, Voto e Decisão.

13.5. Determinar o encaminhamento de cópia do Relatório, Voto e Decisão ao atual gestor para a adoção de medidas necessárias à correção dos procedimentos inadequados de modo a prevenir a ocorrência de outros semelhantes.

13.6. Determinar o envio dos autos ao Cartório de Contas deste Tribunal para adoção das providências de sua alçada e, após, à Coordenadoria de Protocolo para as providências de mister.

 

[1] OSÓRIO, Fábio Medina. Direito Administrativo Sancionador. 7ª ed. São Paulo: Revista dos Tribunais, p. RB-5.7. Disponível em: https://proview.thomsonreuters.com/launchapp/title/rt/monografias/107536121/v7/page/RB-5.7. Acesso em 06 de abril de 2022.

[2] BRASIL, Tribunal de Contas da União. TC 013.984/2014-4, Recuso de Reconsideração em Tomada de Contas Especial, Relator Ministro Benjamin Zymler.  Ata nº 14/2018 – 1ª Câmara, código eletrônico para localização na página do TCU na internet: AC – 4423 –14/18-1, data da sessão: 08/05/2018.

Documento assinado eletronicamente por:
ANDRE LUIZ DE MATOS GONCALVES, CONSELHEIRO (A), em 06/04/2022 às 13:51:59
, conforme art. 18, da Instrução Normativa TCE/TO Nº 01/2012.
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